Sentou-se no corredor do quinto andar lendo Eclesiastes "Tudo tem seu tempo e há tempo para todo propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer e tempo de morrer. Há tempo de plantar e tempo de colher o que se plantou. Tempo de chorar e tempo de rir. Tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntar pedras. Tempo de prantear e tempo de dançar..." Parou nessa frase. Pensava: "Prantear... palavra engraçada."Ficou com isso na cabeça. Se estava escrito plantar e colher, antônimos... Porque prantear e dançar? Sua cabeça não parava de pensar nisso. Opostos, antônimos. Achou, então, que ela era o antônimo de tudo.
Se tudo tem seu antônimo e ela nunca havia visto o seu... Se achou oposta a tudo. "Tudo não é oposto de nada. Tudo é oposto de mim."Riu sozinha e voltou os olhos pra esquerda. Observou a porta do apartamento de D. Margarida, a vizinha rabugenta. " D. Margarida é o oposto de... de... de flores!" Riu mais uma vez. Segurou os pés sem meias que tocavam o piso do corredor frio. "Frio é oposto de sexo." Tampou a boca, como se alguém a tivesse ouvido falar aquilo. Olhou para os lados para ver se não vinha ninguém e gargalhou.
Ouviu passos de alguém que subia as escadas. Baixou o olhar e ficou apertando a caneta que segurava em sua mão esquerda. Viu Sr. Antônio passar e dizer: "Menina, sai da friagem.Vai pegar uma gripe." Sorriu e disse "Vô, não, seu Antônio... vô não." E acompanhou com os olhos Sr. Antônio desaparecer no fim do corredor, onde a escada começava, logo depois da curva.Continuou com o pensamento dos antônimos. O que seria o contrário de água? "Fogo, claro!... Não, não... fogo não! É... É sal! Água hidrata e sal desidrata." Pensou em como seria regar os girassóis e tulipas com sal, até eles morrerem. Lágrimas caíram de seus olhos. "Não quero que minhas flores morram... não quero."
Ouviu a porta do apartamento se abrir, era sua mãe que havia ido chamá-la pra almoçar. Ela a viu sentada chorando... "Mãe, não quero que minhas flores morram! Vamos colocar água nelas todos os dias, toda hora!". A mãe passou a mão pela sua cabeça e lhe disse baixinho: "As flores têm de morrer, filhinha. Só assim elas dão espaço pra que outras flores nasçam e te façam sorrir. Entende? Elas têm que morrer." Ela entendeu. Entendeu que morte é sinônimo de sorriso. Que pra que ela sorrisse, suas flores precisavam morrer. E entendeu, também, que antes do sorriso as lágrimas aparecem... Mas elas aparecem pra regar sua face e germinar sorrisos.
5 comentários:
íncrivel como esse pessoal talentoso enxerga a sensibilidade nas coisas.
Adorei de verdade, eu leio Eclesiastes SEMPRE!
Tou refletindo nesse seu texto...
Parabéns.
parabéns MESMO.
bem escrito e deveras sensível.
adorei.
Naty...você plagiou de onde?
Hehehe
Brinks, eu não esperava menos de você, nega...
Lindo!
Descobri que Renan é antônimo de Érika!
Postar um comentário