sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Ana e outros demônios


Por: Marcos Vinícius Almeida

Tremura. Barulhos de saliva riçando na pele. E umas doiduras na minha cabeça. Mas quando achei que as coisas iam acontecer de verdade:

- Vamos embora, Luizinho. Já tá escuro.

Fedazunha.

Mas não reclamei. Vai que ela infensa comigo? Então a gente ajeitou as roupas, e deu mais uns amassos meio que numa brincadeira; ela insistindo pra ir, e eu fazendo chantagem:

- Mas um beijo e a gente vai...
- Só mais um... Um só! É o último mesmo. Já tá escuro.
- Ah, esse não valeu...
- Não valeu por quê?
- Tem que ser direitinho...

Quando esse joguinho perdeu a graça, eu catei a bicicleta. Ela foi no cano. Enquanto eu pedalava todo abobado, com as canelas curtas, ela fazia as curvas com as mãos de unhas pintadas. A gente foi rindo muito. E dando mais uns beijinhos quando chegava na subida. Não tinha poeira, poque não tinha carro passando na estrada. E o céu tava todo bonito, uma lua meio tímida vinha brotando detrás da Serra de Luminárias. Ela quis parar pra ver. E como eu tinha colocado o resto da bebida do litro no tanquinho da bicicleta, a gente deu umas bicadas, e deu um abraço quieto, e ela me deu um beijo na testa. E me olhou no olho. Eu tirei o cabelo dela pro lado e dei um beijo na testa dela também. E outro abraço calado.

- Minha mãe vai me matar! - ela disse bem baixinho.
- Ah, fala pra ela que você tava na casa de alguma amiga, ou que foi raptada por alienígenas... sei lá...
- Minha mãe não é simpatizante de Ufologia.. E já deve ter me procurado em tudo é quanto amiga.
- Ah, inventa um trem qualquer, Ana. Inventa que perdeu a carona do ribeirão, e que depois parou na praça pra descansar... Ah, é Carnaval...
- Minha mãe nem gosta de Carnaval, e sabe perfeitamente quando eu tô mentindo.

E a gente foi indo quieto. Com som de chinelo arrastando no chão, as esferas girando dentro da catraca com corrente parada. E os piscas-piscas naturais lá no céu. E na esquina de casa a gente se despediu com um selinho de raspão. E ela desceu correndo na frente, e me mandou esperar. Fiquei olhando as batadas das pernas, e as canelas miúdas carregando o resto do corpo, naquela rua que sempre joguei bola: até sumir detrás do barulho do portão.
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1 comentários:

DiRenan disse...

muito bom, mas era para ter postado completo =p!